Por Lucas Hirata e Daniela Meibak, Valor Econômico, São Paulo
A expectativa de uma nova rodada de corte de juros tem se disseminado pelo cenário dos analistas de diferentes segmentos do mercado. De forma gradual, cresce o grupo de instituições financeiras que veem a Selic escorregando de 6,5% para a casa dos 5% até o fim do ano, mesmo com a apreensão em torno da reforma da Previdência.
As estimativas são respaldadas pela sequência de indicadores fracos de atividade econômica, que têm derrubado as projeções para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019. Tudo isso sugere, na avaliação dos analistas, que a política monetária pode ter de se tornar ainda mais expansionista no Brasil.
De 34 instituições financeiras consultadas pelo Valor, incluindo bancos, consultorias e gestoras, dez estimam que a taxa básica de juros terminará o ano em nível mais baixo do que os atuais 6,50%. Entre os casos mais recentes de adesão ao grupo está o banco Itaú Unibanco, que cortou a estimativa da Selic de 6,5% para 5,75% no fim do ano. Outras casas, mesmo aquelas que mantêm projeção de estabilidade da Selic, não descartam a possibilidade de redução da taxa básica.
O Itaú argumenta que a combinação do ritmo de recuperação da atividade aquém do que era esperado para este ano junto com a confirmação do cenário de inflação bastante benigno justificou o ajuste de suas projeções, segundo Felipe Salles, superintendente de pesquisa econômica do banco. Além da alteração da expectativa para a Selic, o Itaú também reduziu sua projeção para o PIB de 2019 de 2% para 1,3%.
“Quadro de confirmação de inflação benigna e atividade aquém do que esperado abre espaço para corte juros, mas isso não acontece agora. Irá acontecer apenas a partir do momento em que o quadro da reforma da Previdência estiver mais claro e o nosso cenário base é de aprovação no primeiro turno da Câmara até setembro”, afirma.
A projeção para o crescimento do PIB em 2019 do Itaú e de outras instituições já está bem abaixo da mediana das coletas no boletim Focus, que já acumulou a sétima queda consecutiva e agora está em 1,95%. A frágil recuperação da atividade econômica e o ambiente global favorável a emergentes são os principais argumentos dos especialistas que defendem uma nova rodada flexibilização monetária no Brasil.
A Novus Capital, por exemplo, ainda observa alguma incerteza sobre os números de atividade do primeiro trimestre, mas sua estimativa já está próxima de 1,5%. “A fraqueza dos indicadores de atividade econômica tem surpreendido o mercado de maneira significativa”, diz Tomás Goulart, economista-chefe da gestora.
Ao mesmo tempo, os analistas apontam que o cenário global abre espaço para corte de juros, já que os principais bancos centrais do mundo reverteram suas políticas e adotam agora uma estratégia para combater o risco de desaceleração de suas próprias economias – algo que eleva liquidez nos mercados internacionais e favorece o fluxo para mercados emergentes.
Para Cristiano Oliveira, economista-chefe do banco Fibra, esse é um dos principais motivos para se apostar num corte de juros no Brasil – o especialista tem uma das expectativas mais ousadas para a Selic dentre os entrevistados e vê a taxa em 5,25% no fim do ano. Para o PIB, a estimativa do Fibra foi reduzida para 1% neste ano e para 2,26% em 2020.
“Espero que as moedas de emergentes tenham valorização ao longo do tempo, conforme se consolida a visão de que o afrouxamento monetário [no exterior] veio para ficar”, diz Oliveira, que trabalha com dólar próximo de R$ 3,60 em dezembro. A moeda americana tem rondado a marca de R$ 3,85, praticamente o mesmo nível da virada do ano. “Na minha opinião, se não fosse a reforma da Previdência, cuja tramitação é tão difícil e tão lenta, o câmbio estaria muito mais apreciado”, diz.
A confiança dos agentes de mercado no avanço da principal medida do ajuste fiscal – algo que traria a melhora do nível dos ativos financeiros – é uma condição fundamental para o corte de juros, de acordo com alguns profissionais de mercado.
Para fazer sentido o cenário de corte da Selic, seria necessário uma reforma que poupasse, ao menos, R$ 500 bilhões aos cofres públicos em dez anos, potencial de economia fiscal que se equipara com a proposta do ex-presidente Michel Temer para a Previdência, diz Goulart, da Novus. “Aparentemente a aprovação de uma proposta próxima a de Temer aliviaria por alguns anos a necessidade uma nova reforma”, diz o especialista.
O cenário de corte de juros não é predominante no mercado, mas algumas instituições que ainda apostam na estabilidade da taxa básica já admitem ver chances significativas de flexibilização monetária. “É justo dizer que o cenário alternativo, de corte da Selic, pode estar com 30% de probabilidade”, afirma Leonardo Porto, economista-chefe do Citi, que ainda se atém ao cenário de estabilidade da taxa básica.
Alguns fatores, entretanto, ainda restringem o cenário de flexibilização monetária. A comunicação mais cautelosa do Banco Central, principalmente com a troca recente de integrantes da diretoria, e as incertezas em torno da reforma estão entre eles. Para Porto, o corte da Selic não deve se apoiar em apenas um fator, mas é necessária uma configuração com exterior, inflação, atividade e reformas que aumente as chances do corte da Selic.
O eventual corte só seria possível, dizem alguns especialistas, se a inflação começar a surpreender para baixo, ao contrário do que tem ocorrido em alguns indicadores deste começo de ano. A mediana das projeções para o IPCA no Boletim Focus está atualmente em 4,06% para 2019 e 4% para 2020.
“Considerando o prazo em que a política monetária faz efeito, o Banco Central já começa a olhar para 2020, cuja meta de inflação é de 4%. As projeções de IPCA do boletim Focus já estão perto disso, então mesmo que a atividade esteja fraca eu vejo pouco espaço para cortar”, afirma Evandro Buccini, economista-chefe da Rio Bravo, que não vê espaço para flexibilização monetária.
Notícia retirada integralmente do site https://www.valor.com.br/financas/)
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